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Ronaldo Bôscoli entre Vinícius de Moraes e Roberto Menescal |
Depois de “trombar” várias vezes com o compositor e jornalista Ronaldo Bôscoli na pesquisa de seus outros livros, o historiador teve a confirmação definitiva de sua vontade de escrever uma biografia do Lobo depois da grande interpretação de Mateus Solano como o compositor na minissérie “Maysa – Quando Fala o Coração”, exibida pela Globo em 2009.
Pois enfim Denilson está lançando “A Bossa do Lobo” pela Editora Leya. São 500 e poucas páginas que li em menos de uma semana, com uma prosa muito gostosa de ler se e uma pesquisa tão apurada que faz a gente pensar várias vezes: “como ele ficou sabendo desse detalhe?”. Quem se interessa por música brasileira não pode deixar de ler a história dessa figura chave na criação da Bossa Nova, na trajetória de Elis Regina, de Roberto Carlos e do amadurecimento da TV brasileira.
– Você começou na TV cantando em programa de cachorrinho amestrado, Bôscoli para Elis. – E você, que brochou ontem?, Elis para Bôscoli
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Bôscoli entre Tom Jobim e Nara Leão |
O lançamento oficial é hoje no Rio de Janeiro, mas o livro já está à venda nas melhores livrarias e sites. Pra quem estiver no Rio e puder ir, a noite de autógrafos é na Livraria da Travessa de Ipanema, a partir das 19h. A chance de trombar com vários dos personagens do livro é bem grande. ;-)
– Você já fumou maconha?, amigo. – Não, Bôscoli. – É o maior barato!, amigo. – Eu não gosto de coisas baratas. Garçom, me traz um Chivas Regal!, Bôscoli
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Roberto Carlos e Bôscoli |
Outra boa notícia é que um dos filhos de Bôscoli, o Bernardo, está produzindo um documentário sobre o pai, “Se é tarde me perdoa”, aos moldes do doc sobre Wilson Simonal. No site www.ronaldoboscoli.com é possível ver qual o andamento do trabalho. Como há pouquíssimas gravações do pai em vídeo, parte do filme será dramatizado.
Gentilmente o Denilson cedeu com exclusividade a este blog o primeiro capítulo de “A Bossa do Lobo”, que já começa de forma bombástica e não na tradicional, e às vezes maçante, sequência nascimento-adolescência-maturidade-morte.
Primeiro capítulo de “Ronaldo Bôscoli – A Bossa do Lobo”, de Denilson Monteiro:
1
MEDO E DELÍRIO
E subitamente a calma daquela tarde de verão carioca se foi. O céu ficou como breu; prédios começaram a tremer, denunciando que a qualquer momento desmoronariam; o asfalto da Barata Ribeiro dava sinal de que iria se abrir e engolir todos aqueles carros que por ela trafegavam, assim como os pobres infelizes que caminhavam pela calçada. Como testemunha daquela catástrofe iminente, o desespero tomou conta de Ronaldo Bôscoli. Seu coração acelerou, e uma insuportável dor castigou seu peito, o suor ensopava suas mãos, e o ar lhe faltava. Sua única sorte era não estar sozinho, ter ao seu lado Luiz Carlos Miele, a outra metade da dupla “Miele & Bôscoli”, que apimentava o mundo do entretenimento com os shows que criava na noite carioca, e que muitos pensavam tratar-se de uma única pessoa de tão unidos que eram. Ronga segurou forte o braço do amigo e, quase sem forças, disse:
— Vamos correr pra casa que o mundo vai acabar.
O Barba não compreendeu o sentido daquela inesperada visão profética do camarada. Achou que fosse mais uma de suas brincadeiras.
— O que é isso Ronaldo, que novidade é essa?
— Bicho, eu tô falando sério, vamos depressa que vai acabar. ESSA MERDA VAI ACABAR!
— Acabar como?
— CARALHO, VAMOS EMBORA, MIELE! ESSA MERDA VAI ACABAR!
Miele viu que a coisa era pra valer. Fez sinal para um táxi que passava, entrou nele com o amedrontado Ronaldo e deu ordem para o chofer:
— Toca pra Visconde de Pirajá!
À medida que o táxi se aproximava de Ipanema, o céu abandonava o negro, ficando num tom de cinza menos amedrontador. E, quando o carro parou em frente ao prédio da Visconde de Pirajá nº 22, e Miele o tirou de dentro, Ronaldo já podia ver o brilho de uma tímida luz que lhe aquietou um pouco o espírito. No elevador, seu coração voltou aos 80 batimentos normais, o suor gelado que escorria por seu rosto e mãos evaporou, e o ar retornou aos seus pulmões.
Assim que chegou à cobertura onde morava, Bôscoli abriu a porta e correu direto para o bar. Pegou uma garrafa que vivia enfiada num saco de papel, um copo e se serviu de uma dose de um líquido avermelhado. Era um Cinzano, um vermute, mistura de vinho, açúcar e extrato de plantas aromáticas, cujo fabricante afirmava “ir bem a toda hora e em todo lugar”, mas que Miele, assim como os demais amigos do Velho, considerava intragável e não compreendia como ele a apreciava, razão pela qual tinha por hábito manter a garrafa escondida num saco de supermercado.
Depois de o primeiro gole escorregar por sua garganta, Ronaldo já conseguia ver o resplandecente sol que iluminava aquele fim de tarde na cidade de São Sebastião e voltou completamente ao seu estado normal. Contudo, Miele, ainda assustado, quis uma explicação para aqueles momentos de tensão que presenciara.
— E aí, Ronaldo?
— Pois é, às vezes me dá uns troços assim.
Ronaldo vivia dizendo para o amigo que era maluco, que tinha carteira de sócio de sanatório e que, por isso, não era bom contrariá-lo. Mas Miele sempre achou que fosse piada. Entretanto, o que o Barba havia testemunhado pela primeira vez foi uma das crises de neurose de angústia ou síndrome do pânico que costumavam acometer Ronga. Quem via Ronaldo Bôscoli, o brincalhão e sorridente pregador de peças; a língua afiada capaz de ir direto a mais escondida fraqueza de quem cruzasse seu caminho; o homem que colocava o dedo nas feridas alheias e ainda o girava para machucar um pouquinho mais; o bem-sucedido e invejado sedutor de incontáveis corações femininos, não imaginava a enorme legião de demônios com que ele tinha de pelejar. Colocar os pés na rua era uma luta diária para ele.
Como ainda não havia sido daquela vez que o mundo acabaria, totalmente relaxado, depois do último trago e de contar para Miele mais uma versão de como suas crises tiveram início, Ronaldo foi apanhar papel e lápis para tentar escrever novas ideias para a reformulação de O Fino da Bossa, o programa da TV Record de São Paulo que estava patinando na audiência. Ele e o Barba tinham sido contratados para dar um jeito na atração e fazer com que ela recuperasse os telespectadores que havia perdido. Era um desafio, mas em nenhum momento tão grande quanto ter de lidar com a estrela do programa e sua inimiga mais do que declarada, Elis Regina. O mundo podia ter escapado de seu fim há poucos instantes, mas ninguém teria como assegurar que isso não aconteceria no dia marcado para a primeira reunião dos dois.
Título: A Bossa do Lobo: Ronaldo Bôscoli (compre aqui)
Autor: Denilson Monteiro
Editora: LeYa Brasil
Formato: 16 x 23cm
Nº de páginas: 544
Preço: R$ 44,90
http://geral.leya.com.br/catalogo/detalhes_produto.php?id=54352
Acabei de ler este livro. Sou fã de Bossa Nova e adorei a leitura. Foi puro deleite. Denilson Monteiro está de parabéns. Foi muito feliz nesta obra.
Sensacional.